sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Freud, Mesmer e Charcot

Jean-Martin Charcot
1) São poucos os comentaristas que não ressaltam a relação de Freud com Charcot em geral e, especificamente, a dimensão teatral que o francês fazia questão de incorporar à sua vida (profissional e pessoal). A dimensão que fascinava um Freud contido e ainda desprovido de recursos financeiros: a mansão de Charcot era recheada de tapeçarias, vasos, antiguidades (indianas, chinesas, gregas, egípcias, assírias), quadros, móveis finos, candelabros, vitrais, numa mistura vertiginosa de temporalidades e geografias. As estantes de sua biblioteca pessoal copiavam o modelo criado por Michelangelo para a Libreria Laurenziana dos Médici, em Florença. Um ambiente que funcionava como um palco para sua personalidade.
2) Como escreveu Robert Darnton sobre Mesmer (que teve seu auge aproximadamente cem anos antes do auge de Charcot), os ambientes utilizados por Charcot eram milimetricamente ajustados para causar efeito, decorados para transtornar corpo e mente: no gabinete de Charcot no Hospital da Salpêtrière toda a sala e todos os móveis eram pintados de preto; uma única janela lançava luz sobre as paredes decoradas com gravuras de Rafael e Rubens. Gente de toda a Europa o consultava - credibilidade que Freud replicaria em Viena alguns anos depois (e que Edward Said, muito tempo depois, viraria do avesso ao pensar Freud e os não-europeus). 
3) Georges Didi-Huberman, em A invenção da histeria, frisa o olhar "fotográfico", "teatral" de Charcot - ele reproduzia nos corpos das histéricas os movimentos que encontrava nos homens infames encontrados na história da arte (Charcot publicou dois livros que exercitavam uma arqueologia da doença na iconografia ocidental - O demoníaco na arte, de 1887, e Deformados e doentes na arte, de 1889). Charcot era um misto de médico, feiticeiro, curador, arquivista, detetive, filósofo, colecionador - um Carlos Wieder da alta burguesia francesa.   

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