terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A estranheza como procedimento

Roberto Calasso, em um dos ensaios de seu livro La follia che viene dalle Ninfe, de 2005 (uma coletânea de ensaios esparsos que terminaram por convergir, finalmente, ao tema da ninfa), reproduz uma história contada por Martin Buber, a história do Rabi Eisik, filho de Jekel, que morava em Cracóvia. O sonho, sonhado repetidas vezes por Eisik, lhe mostrava que ele deveria ir a Praga, pois havia um tesouro escondido embaixo da ponte que levava ao castelo do rei. O Rabi Eisik vai então a Praga e passa dias vagando pelas proximidades da ponte, sempre vigiada por sentinelas. O capitão da guarda, observando a movimentação do velhote, vai até ele e pergunta o que quer ali. O Rabi Eisik conta a história de seu sonho. O capitão dá risada e conta outra história ao Rabi, mais ou menos assim: "Veja o senhor que se os sonhos fossem confiáveis, eu deveria agora estar fazendo uma viagem inversa à sua. E, claro, não encontraria nada. O senhor saiba que durante muitos dias sonhei que encontrava um tesouro em Cracóvia, na casa de um rabino chamado Eisik, filho de Jekel, dentro da estufa. Imagine o senhor, ir a Cracóvia, onde metade dos homens se chama Eisik e a outra metade Jekel...". Eisik escuta a história do capitão sem fazer qualquer comentário e, logo em seguida, volta correndo para sua casa em Cracóvia. Calasso escreve que o ponto importante da história não é que o tesouro que procuramos está mais próximo do que pensamos - isso tornaria a história igual a milhares de outras. O ponto fundamental é que o local do tesouro deve ser revelado por um estrangeiro - alguém que sequer faz ideia da iluminação que está proporcionando. Se não tivesse encontrado o estrangeiro, o Rabi Eisik jamais teria olhado sua estufa sob o ângulo correto.

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